quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Um diálogo com Deus


Confronto


Um diálogo com Deus


LV)  Da Humana Condição

 Só isto, a vida
– ou nisto resumida.
Só isto, a vida humana:
um breve rastejar, entre o Big Bang e o Apocalipse
(se é que houve um
e que haverá o outro).
Certo, o rastejar.
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Mas se teu Reino
não é uma recompensa nem um prêmio
e sim uma construção,
e não está num Após nem num Além
mas num Agora e num Aqui
– em nós mesmos –
e temos nós que construí-lo dia a dia,
vivendo como vivemos
e sendo como somos, então
Inferno e Paraíso são apenas projeções,
não transcendentes redutos:
simples imagens
de nosso estar-na-Terra,
de nosso ser-com-os-outros.
E não serás um Ser (em si):
apenas uma Idéia (em nós).
E a Eternidade é somente um hiper-agora, impassável,
o sempre-presente.
E o Infinito é somente um hiper-aqui, impreenchível,
o todo-em-volta.
E o Inferno é mesmo os outros.
O Paraíso também.
E o ser humano é mesmo este misto desequilibrado entre o sublime e o mesquinho,
breve lampejo
entre uma treva sem princípio e uma treva sem final.
E somos livres,
apenas do futuro ignorantes,
sem mistério a desvendar.
E não há prêmio nem castigo, transferidos:
apenas opções e conseqüências, imediatas.
E a vida é este intermitente desafio:
o aproveitamento/desperdício de energia e liberdade,
sem hipótese de reservas;
esta cega seqüência de desejo e luta, 
o insaciável desejo
e a incessante luta;
para a conquista ou para a falta,
a precária conquista
ou a freqüente falta.
E, de tentativa em tentativa,
o frustrante desfrute
ou a plena frustração.
E, na falência da aventura,
a certa perda.
E o desengano.
E a decomposição,
em pó ou cinza.
E o Nada.
Nada além, aquém.
E a Existência é o todo do tempo.
E a Terra é o todo do espaço.
E não precisa nem da idéia de Eternidade e nem da de Infinito
(exceto os do Sonho).
E tudo é mortal, exceto o trans-viável.
E não há Causa primeira nem Sentido último,
que é sempre um trânsito,
de sempre,
para sempre,
e temos só que nos equilibrar.
E esta é a nossa condição,
sem pessoal ou coletiva culpa.
É parca,
é muito parca.
E não muda
por mais que a gente mude.

Mas, descendente de símios,
podia o homem ser mais nobre?
Rebento de uma explosão,
podia o mundo ser mais firme?
Originária do acaso,
podia a vida ser mais justa?
E se, sem Ti, não tem sentido,
talvez nem careça:
basta ter duração.
E que tudo se esgote em seu lampejo, sem reflexo.
E, no lugar da transcendência da alma,
a imanência do corpo.
E, por sobre o consumo do tangível,
a latência do inefável.
E é esse o seu sentido.
Pode ser muito pobre,
mas é o que ela ostenta:
o da luminescência, ao invés do da Luz.
Temos só de evitar que se desfaça aos ventos em contrário.
E estamos, apenas.
E passamos.
Pior é que sofremos que não basta estar.
E que é penoso passar.

Ou nossa vida é mesmo esta constante peregrinação
e só descansaremos quando voltarmos à origem?

Mas o alvo está à vista:
que cada um aponte suas armas.

Pedro Lyra


* Pintura de Alex Grey

3 comentários:

Jaqueline Sales disse...

E aí, mana! Aqui, chove desde que chegamos, desde segunda-feira, e sem parar. É água dando na canela, menina! Estou sem curativo, pois está sequinho o local da cirurgia, não coça, não incomoda, então considerei oportuno ficar sem cobrir os pontos.

Estamos bem, mas ainda não pude ir à casa da Marta e da Angela porque estou resolvendo uns probleminhas.

Deixo um grande BeijUivoooooooooooooo de agradecimento. Inté!

Anônimo disse...

Silvia,li e reli o poema e o gajo escreve bem. Jinhos de Portugal.

António

Anônimo disse...

Silvinha, o Pedro Lyra tem um estilo muito forte e realista, pouco romântico, mas eu gostei. Um beijo.

António José

www.antoniojosedesousa.blogspot.com