sábado, 11 de abril de 2009

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ASTRID CABRAL
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MODO DE AMAR
Amor com tremor de terra
abalando montanhas e minérios
nas entranhas da minha carne.
Amor como relâmpago e sóis
inaugurando auroras
ou ateando faíscas e incêndios
nas trevas da minha noite.
Amor como açudes sangrando
ou caudais e tempestades
despencando dilúvios.
E não me falem de ruínas
nem de cinzas, nem de lama.
Astrid Cabral
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Trabalho de Renso Castaneda, magnífico pintor peruano
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O FOGO


Juntos urdimos a noite
mais seu manto de trevas
quando as paredes recuam
discretas em horizontes
de além-cama e num espaço
de altiplano rolamos
nossos corpos bravios
de animais sem coleira
E juntos acendemos
em cachoeiras de luz
com as centelhas que nós
seres primitivos forjamos
com a pedra lascada
dos sexos vivos.

Astrid Cabral.
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LÍRICO E LÚBRICO
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Lírico e lúbrico
o amor brota lírios
e trinca a polpa de frutos.
De luz cintila o encontro
em que nos provamos a fundo
curvas de carne e matos de pêlo.
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Além, avulso o tempo
rola expulso do céu
que no chão conquistamos.
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E nos sentimos pássaros
em que plumas de nuvens
sobre o dorso pousassem.
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E nos provamos raízes
investigando a terra
em seu segredo de barro.
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E encarcerados somos
entre próximos cristais
de estrelas e rios.
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Astrid Cabral
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Mulher &Lua
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MÃOS
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No deserto da insônia
a mão, triste, me acena
nua de anéis e luvas.
Dedos gesto de adeus
anunciam o abandono
da matéria efêmera.
Dos campos do sono
a mesma mão me chama
cintilante de estrelas.
Tento alçar-me da cama
no encalço do convite
mas a carne me amarra.
E enquanto o corpo dura
fico entre a dor da perda
e o desejo do encontro.
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Astrid Cabral
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Constantin Brancusi
The Kiss, 1908
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CARESTIA
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Amor custa bem caro.
Mesmo assim depenamos bolsos
e bolsas de moedas raras.
Por ele pagamos, em prestações
nem sempre suaves, quanto
de entrada supúnhamos
de todo não poder:
o alto preço dos sustos,
a conta escorchante
das noites em claro,
os juros extorsivos
do medo de perdê-lo,
a tristeza do saldo zero.
Queixamo-nos de carestia
se de amor-próprio ainda
nos sobra algum trocado,
mas que fazer quando só
amor é o lucro que buscamos?
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Astrid Cabral
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Astrid Cabral Felix de Sousa (Manaus, 25 de setembro de 1936) é poeta , contista, professora e funcionária pública brasileira. Viúva do poeta Afonso Felix de Sousa.
Diplomada em Letras Neolatinas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e em língua inglesa e literatura norte-americana pelo Teacher's Training Course do IBEU.
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Atuação Profissional:
Professora universitária na Universidade de Brasília;
Oficial de chancelaria do Ministério das Relações Exteriores;
Oficial de chancelaria da Embaixada do Brasil em Beirute e em Chicago.
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Livros Publicados:
Alameda, 1963;
Ponto de cruz, 1979;
Torna-viagem, 1981;
Zé Pirulito, 1982;
Lição de Alice, 1986;
Visgo da terra, 1986;
Rês desgarrada, 1994;
De déu em déu, 1998;
Intramuros, 1998.
Rasos d`água, 2003.
Jaula, 2006.
Ante-sala, 2007.
Antologia Pessoal, 2008.
50 Poemas escolhidos pelo autor, 2008.
Les doigts dans l'eau, 2008.
Cage, 2008.
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Traduções:
Walden, ou a vida nos bosques, 1984
A desobediência civil, 1984
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Prêmios Literários:
Prêmio Olavo Bilac, da Academia Brasileira de Letras, 1987, com Lição de Alice;
Prêmio Nacional de Poesia Helena Kolody, em 1998, com Intramuros.
Prêmio Nacional de Poesia da Academia Brasileira de Letras, em 2004, com Rasos d'água.

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4 comentários:

Unknown disse...

Acordei cedo. A manhã está fria mas a leitura destes poemas me redobrou a vontade de os ler e entender.
Tinha pensado na Sylvia e em como tem tempo e gosto por procurar estes temas e estes poemas.
Lembrou-me uma fraze do seu filho:
«Tudo quanto a Mãe faz é sempre bem feito..........»
Não sei situar este comentário mas está no seu blogue.
Graças a Deus que temos poetas com capacidade de nos dar coisas saborosas e que nossas almas enchem de luz.
Tambem fico contente quando se encontram outros que as sabem ler e entender. Parece que o seu trabalho tem sido muito bom.

prafrente disse...

A feita é feita de encontros e desencontros, de lugares e não lugares...a vida é um eterno recomeçar, não só no campo material como, na maioria das vezes,no íntimo das emoções.

Beijinho de portugal

Jaqueline Sales disse...

São tantas emoções e sentimentos que parece que o coração tem andado por entre as estrelas... Acertei?

BeijUivoooooooooooosssssssssss da Loba

Zica Cabral disse...

"MODO DE AMAR

Amor como tremor de terra
abalando montanhas e minérios
nas entranhas da minha carne.
Amor como relâmpago e sóis
inaugurando auroras
ou ateando faíscas e incêndios
nas trevas da minha noite.
Amor como açudes sangrando
ou caudais e tempestades
despencando dilúvios.
E não me falem de ruínas
nem de cinzas, nem de lama."

Querida Sylvia, não tenho tempo agora para ler todos os poemas mas adorei este.
Não conhecia a poetisa e obrigado porno-la apresentar.
A unica maneira de AMAR é com intensidade, com a força e com a profundidade. De outra form não vale a pena. Amar com prudencia, com 5 paraquedes e 20 redes por baixo, olhando para o lado a er se se esta seguro..............não é amar de verdade.
Lógico que depois quando se cai.......CAI-SE! Mas enquanto dura como dizia o Vinicius,que seja infinito!!