domingo, 25 de janeiro de 2009

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GILBERTO MENDONÇA TELES
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CRIAÇÃO
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O verbo nunca esteve no início dos grandes acontecimentos.
No início estamos nós, sujeitos
sem predicados,
tímidos,
embaraçados,
às voltas com mil pequenos problemas
de delicadezas,
de tentativas e recuos,
neste jogo que se improvisa à sombra
do bem e do mal.
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No início estão as reticências,
este-querer-não-querendo,
os meios-tons,
a meia-luz,
os interditos
e as grandes hesitações
que se iluminam
e se apagam de repente.
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No início não há memória nem sentença,
apenas um jeito do coração
enunciar que uma flor vai-se abrindo
como um dia de festa, ou de verão.
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No início ou no fim (tudo é finício)
a gente se lembra de que está mesmo com Deus
à espera de um grande acontecimento,
mas nunca se dá conta de que é preciso
ir roendo,
roendo,
roendo um osso duro de roer.
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PERCEPÇÃO
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O mundo te rodeia de cercas e desejos,
te comprime no refúgio de teu quarto
e te restringe à lâmina das coisas
no seu fino acontecer.
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Todavia, o amor é para toda a vida,
é para sempre e um dia e mais talvez:
o amor te prende às palavras e te liberta
na invenção de alguns códigos e silêncios.
É possível que a tua cota de realidade
seja agora por demais excessiva
e apenas te deixe perceber os possíveis
de outros planos e subversões.
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Vê como as cortinas disfarçam o teu olhar,
como as ruas se enrodilham aos teus pés
e como algumas veredas vão desaparecendo
nos teus desertos e viagens.
Que seria de ti sem os teus espelhos?
sem a jarra-de-flores que guarnece
o espaço dessa mesa de pernas para o ar,
com velhas catacreses da gaveta?
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É para ti que as águas vão polindo
os sentidos desse único sentido
ainda vulnerável, mas perdido na cena,
no espetáculo obsceno de ti mesmo.
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Gilberto Mendonça Teles nasceu em 30 de junho de 1931 na cidade de Bela Vista de Goiás, uma cidade de pouco mais de 20 mil habitantes localizada a 45 km de Goiânia.
Formou-se em Direito e Letras Neolatinas pela Faculdade de Filosofia da Universidade Católica de Goiás e em Direito pela UFG, sendo professor-fundador destas duas universidades. Após isso, concluiu o seu doutorado em Letras e Livre-docente em Literatura Brasileira pela PUC-RS. Nessa mesma época, forma-se como professor de Língua Portuguesa pela Universidade de Coimbra, em Portugal
Em 1970 foi contratado como professor titular de Língua Portuguesa pela PUC-Rio, onde trabalha até hoje. É professor catedrático visitante de literatura brasileira nas universidades de Lisboa, Universidade de Rennes, Chicago e Salamanca. Como poeta e crítico literário pertence a várias instituições especializadas, dentre elas, Société de Linguistique Romane, em Paris, Sociedade de Língua Portuguesa, em Lisboa, Asociación de Estudios Lingüísticos, em Montevidéu, Academia Goiana de Letras, em Goiânia, Academia de Filologia, no Rio de Janeiro, Academia Carioca de Letras e PEN Clube do Brasil.
Gilberto Mendonça Teles é, também, académico correspondente da Academia das Ciências de Lisboa.
É considerado o escritor goiano mais famoso na Europa, tendo os seus livros escrito em diversas línguas. Recebeu pelo conjunto de sua obra, o prêmio Machado de Assis, considerado o maior prêmio literário do Brasil, pela Academia Brasileira de Letras.
Foi homenageado na Bienal do Livro do Rio de Janeiro em 2005 ("50 anos da Literatura de Gilberto Mendonça Teles"), daí surgiu a obra A plumagem dos nomes, com 812 páginas de cartas, depoimentos, estudos e reconhecimento ao ícone literário brasileiro, Gilberto Mendonça Teles.
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Obras:
Avorada (1955)
Estrela D'alva (1956)
Planície (1958)
Fábula de fogo (1961)
Pássaro de pedra (1962)
Sintaxe invisível (1967)
La palabra perdida, antologia (1967) (Escrito em espanhol)
A Raiz da Fala (1972)
A Arte de Armar (1972)
Poemas reunidos (1978)
A Retórica do Silêncio (1979)
Saciologia Goiana (1982)
Plural de nuvens (1984)
Estudos de Poesia Brasileira (1985)
A Crítica e o Romance de 30 no Nordeste (1990)
Falavra (1990)
L'animal (1990) (Escrito em espanhol)
Nominais (1993)
A Crítica e o Princípio do Prazer (1995)
E cone e sombras (1995)
A Escrituração da Escrita (1996)
Sonetos (1998)
Casa de Vidro (1999)
Caixa de Fósforo (1999)
Álibis (2000)
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