Soneto da Consolação - XXIX
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Poeta
a vida é uma luta por um quê
que menos escolhemos
que seguimos.
Sabemos que é penoso
que é precário
e assim mesmo o buscamos
como ao Bem.
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E a vida às vezes se reduz à busca.
E o encontro às vezes nega seu motivo.
Melhor não alcançar
( o fruto é incerto )
que alcançar e perder
( é certa a perda ).
O perigo não brota ao que se encontra
mas ao que se imagina
e se persegue.
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E ao se morrer sem nunca o ter vivido
resta um consolo
( amargo,
mas consolo):
- a dor da perda
é a dor do Inevitável;
- a de não encontrar
é a do Impossível.
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Soneto de Constatação — XXVII
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Amor — única síntese da vida.
E o só se atinge por curvas, de viés:
se se quiser amar— tem-se que conceder;
se se quer ser amado— tem-se que denegar.
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Infunde náusea ou júbilo, sem meio-termo.
Se às vezes satisfaz, quase sempre contraria:
queremos reter o gozo
— desliza na fruição;
queremos deter a dor
— se petrifica na mágoa.
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Põe um sentido à vida
fugaz — por já passando;
pospõe-lhe um sem-sentido
constante — por presente.
E nos larga no éter, sem referência e sem volta.
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Amante
não se sabe o que fazer com esta graça.
Amado
não se sabe o que fazer com esta fonte.
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Triste: só o não-amante sabe ser amado.
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Apenas uma lembrança
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Passa na madrugada
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Passa na madrugada
a lembrança de um desejo.
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Nenhum ressentimento.
Nenhum ressentimento.
Nenhum sentimento, também.
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Apenas a lembrança.
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E era belo o tempo
Apenas a lembrança.
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E era belo o tempo
—aquele tempo em que o amor justificava a nossa vida
com uma troca de vivências.
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Passou.
Passou.
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Como esta madrugada
Como esta madrugada
que te despertou por um momento.
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Agora é dia.
Agora é dia.
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E já não vejo teu olhar
E já não vejo teu olhar
no sol que surge.
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Contágio (1995)
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Pedro Wladimir do Vale Lyra nasceu em Fortaleza-Ce, a 28/01/1945. É Doutor em Poética. Professor de Poética na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Professor-visitante em universidades de Portugal, Itália, França e Alemanha. Poeta, crítico e ensaísta. É autor de Sombras (1967), Doramor (1969), Decisão (1983/85), Desafio (1991), Contágio (1993), Errância (1996), todos de poesia. Livros de crítica: Poesia Cearense e Realidade Atual (1975/81), O Real no Poético (1980), O Dilema Ideológico de Camões e Pessoa (1985), O Real no Poético II (1987). Livros de ensaio: Utiludismo (1976/82), Literatura e Ideologia (1979/93); Coceito de Poesia (1986/92). Organizador de Sincretismo: A Poesia da Geração 60 (1995).
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4 comentários:
Sua menina, o Pedro é um grande poeta disso ninguém tem dúvida.
Essas poesias colocadas aqui são ouro em pó, dona moça, demais da conta como diria alguém, faça fé! kkkkk
bjs
O Sibarita
Que alegre surpresa, Silvia!
Agradeço muito sua iniciativa e as suas palavras.
Bem como o comentário d´Sibarita.
Um grande abraço - e viva a poesia,sempre!
Sylvia,que maravilha, amiga! Que bom gosto... Chega a ser uma grata surpresa. Trabalho culto e erudito... Parabéns. Vou fazer um texto mais completo... Nossa! bjs, minha linda!...
Lindo blogger, Sylvia, sensível, de bom-gosto , um espaço democrático, aos novos e consagrados. Parabéns, fiquei honrado por ter alguns trabalhos meus aqui expostos. Continue e, como o Pedro disse, 'viva a poesia, sempre!' Grande abraço.
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